A minha Lista de blogues

O tempo decorre como uma espiral.

Espirais. Círculos e ciclos. O tempo decorre como uma espiral. Roda, anda, segue e avança. Os minutos, as horas e os ritmos da vida parecem repetir-se. Nunca nada é igual. Há um início mas o fim ainda não está visível.

sexta-feira, 30 de janeiro de 2015



óleo s/tela de Emília Matos e Silva  (colecção particular)

 Entre o sono e sonho


Entre o sono e sonho,
Entre mim e o que em mim
É o quem eu me suponho
Corre um rio sem fim.

Passou por outras margens,
Diversas mais além,
Naquelas várias viagens
Que todo o rio tem.

Chegou onde hoje habito
A casa que hoje sou.
Passa, se eu me medito;
Se desperto, passou.

E quem me sinto e morre
No que me liga a mim
Dorme onde o rio corre
— Esse rio sem fim.


Fernando Pessoa, in "Cancioneiro

terça-feira, 27 de janeiro de 2015





óleo s/tela em cartão Emília Matos e Silva (500 mm x 700 mm)

Por vezes à noite há um rosto
Que nos olha do fundo de um espelho
E a arte deve ser como esse espelho
Que nos mostra o nosso próprio rosto

Jorge Luis Borges em "Arte Poética

domingo, 25 de janeiro de 2015





óleo s/tela Das brumas do tempo (colecção particular)

Os Cavaleiros

- Onde vais tu, cavaleiro,
Pela noite sem luar?
Diz o vento viajeiro,
Ao lado d'ele a ventar...
Não responde o cavaleiro,
Que vai absorto a cismar.
- Onde vais tu, torna o vento,
N'esse doido galopar?
Vais bater a algum convento?
Eu ensino-te a rezar.
E a lua surge, um momento,
A lua, convento do Ar.
- Vais levar uma mensagem?
Dá-m'a que eu vou-t'a entregar:
Irás em meia viagem
E eu já de volta hei-de estar.
E o cavaleiro, à passagem,
Faz as árvores vergar.
- Vais escalar um mosteiro?
Eu ajudo-t'o a escalar:
Não há no mundo pedreiro
Que a mim se possa igualar!
Não responde o cavaleiro
E o vento torna a falar:
- Dize, dize! vais p'ra guerra?
Monta em mim, vou-te levar:
Não há cavalo na Terra
Que tenha tão bom andar...
E os trovões rolam na serra
Como vagas a arrolar!
- E as guerras hás-de ganha-las,
Que por ti hei-de velar:
Ponho-me à frente das balas
Para a força lhes tirar!
E as árvores formam alas
Para os guerreiros passar.
- Vais guiar as caravelas
Por sobre as águas do mar?
Guiarei as tuas velas
À feição hei-de assoprar.
E os astros vêm ás janelas
E a lua vem espreitar...
- Onde vais na galopada,
À tua infância, ao teu lar?
Conheço a tua pousada:
Já lá tenho ido ficar.
E vai longe a trovoada,
Vai de todo a aliviar.
- Vais ver tua velha tia,
Na roca de oiro a fiar?
Loiro linho que ela fia,
Ajudei-lho eu a secar!
E o luar é a Virgem Maria...
Que lindo vai o luar!
- Vais ver a tua mãezinha?
Coitada! vi-a expirar:
Tinha a alma tão levezinha,
Que voou sem eu lhe tocar!...
E o cavaleiro caminha,
Caminha sem se importar!
- Vais ver tua irmã? Ao peito
Traz um menino a criar:
Ai com que bom, lindo jeito
Ela o sabe acalentar!
E o vento embala no peito
Uma nuvem, p'ra imitar!
- Onde vais tu? Aonde, aonde?
Fantasma! vais-te casar?
Eu sei da filha d'um conde
Que por ti vive a penar...
E o fantasma não responde,
Sempre, sempre, sempre a andar!
- Vais à cata da Ventura
Que anda os homens a tentar?
(Ai d'aquele que a procura
Que eu nunca a pude encontrar...)
N'isto, pára a criatura,
Faz seu cavalo estacar:
- Vento, sim! Espera, espera!
Que estrada devo tomar?
(É um menino, é uma quimera
E todo lhe ri o olhar...)
E o vento, com voz austera,
Dor, querendo disfarçar:
- Toma todas as estradas
Todas, áquem e além-mar:
Serão inúteis jornadas,
Nunca lá hás-de chegar...
Palavras foram facadas
Que é vê-lo, todo a sangrar...
E seus cabelos trigueiros
Começam de branquear,
E olham-se os dois cavaleiros...
Quedam-se ambos a cismar.
Brilha o Oriente entre os pinheiros,
Ouvem-se os galos cantar...
- Adeus, adeus! Nasce a aurora,
Adeus! vamos trabalhar!
Adeus, adeus! vou-me embora:
Chamaram-me as velas, no mar...
o vento vai por hi fóra,
No seu cavalo, a ventar...



António Nobre, in 'Só' 

sexta-feira, 23 de janeiro de 2015


retrato a carvão da minha mãe  (colecção particular) 

Para Sempre

Por que Deus permite 
que as mães vão-se embora?
Mãe não tem limite,
é tempo sem hora,
luz que não apaga
quando sopra o vento
e chuva desaba,
veludo escondido
na pele enrugada,
água pura, ar puro,
puro pensamento.
Morrer acontece
com o que é breve e passa
sem deixar vestígio.
Mãe, na sua graça, 
é eternidade. 
Por que Deus se lembra
— mistério profundo —
de tirá-la um dia?
Fosse eu Rei do Mundo,
baixava uma lei:
Mãe não morre nunca,
mãe ficará sempre
junto de seu filho
e ele, velho embora,
será pequenino
feito grão de milho.

Carlos Drummond de Andrade, in 'Lição de Coisas' 

quinta-feira, 22 de janeiro de 2015


Pintura a oléo s/telas Simorgh (1000 mm x 700 mm)



Queria, queria
Ter a singeleza
Das vidas sem alma
E a lúcida calma
Da matéria presa.

Queria, queria
Ser igual ao peixe
Que livre nas águas
Se mexe;

Ser igual em som,
Ser igual em graça
Ao pássaro leve,
Que esvoaça...

Tudo isso eu queria!
(Ser fraco é ser forte).
Queria viver
E depois morrer
Sem nunca aprender
A gostar da morte.


Pedro Homem de Mello, in "Estrela Morta"

terça-feira, 20 de janeiro de 2015

Inês de Castro

Estavas, linda Inês, posta em sossego,
De teus anos colhendo o doce fruto,
Naquele engano da alma, ledo e cego,
Que a Fortuna não deixa durar muito;



óleo s/tela Inês de Castro ( Estavas, linda Inês, posta em sossego, particular)


Estavas, linda Inês, posta em sossego,
De teus anos colhendo o doce fruto,
Naquele engano da alma, ledo e cego,
Que a Fortuna não deixa durar muito;
Nos saudosos campos do Mondego,
De teus fermosos olhos nunca enxuto,
Aos montes ensinando e às ervinhas
O nome que no peito escrito tinhas.


De teu príncipe ali te respondiam
As lembranças que na alma lhe moravam,
Que sempre ante seus olhos te traziam,
Quando dos teus fermosos se apartavam;
De noite, em doces sonhos que mentiam,
De dia, em pensamentos que voavam,
E quanto enfim cuidava e quanto via
Eram tudo memórias de alegria.


De outras belas senhoras e princesas
Os desejados tálamos enjeita,
Que tudo enfim, tu, puro amor, desprezas,
Quando um gesto suave te sujeita.
Vendo estas namoradas estranhezas,
O velho pai sisudo, que respeita
O murmurar do povo e a fantasia


Estrofes sobre Inês de Castro nos LUSÍADAS de Luís de Camões



Do filho que casar-se não queria,

sábado, 17 de janeiro de 2015




óleo s/tela Emília Matos e Silva (colecção particular)


Quem quer que sejas tu, que neste abrigo
Vieste em hora mansa hoje parar,
Feliz! Vens encontrar aqui contigo
Os tesouros que andaste a procurar.

Vens encontrar, sob o silêncio amigo,
A paz do ouvido e a glória do olhar.
E até, quem sabe? Aquele beijo antigo
Que há muito tempo não sabias dar.

Vens encontrar, (é tarde? Não importa),
Um bem que passou à tua porta.
Um grande amor, nem tu soubeste a quem.

E vens, (tanta riqueza em toda a parte),
Vens a ti mesmo, atónito, encontrar-te.
És um poeta, e nunca o viste bem.....


Soneto de Nunes Claro publicado no livro " Na Cinza das Horas".

quarta-feira, 14 de janeiro de 2015




óleo s/tela Emília Matos e Silva (colecção particular)

Caminho do vento

caminho do vento
nas cores
dos teus olhos

partida do porto
nas dores
dos teus passos

chegada do tempo
nos lares
dos teus barcos

balanço do corpo
nos mares
dos teus braços

poema de Fernando Sousa Marques

terça-feira, 13 de janeiro de 2015





óleo sobre tela Emília Matos e Silva (colecção particular)

Sorrio à beira-Tejo
que à beira mar não rio
o mar perdido além
em devaneios. No cais
procuro em águas apartadas
pelo sulco dos barcos o sonho
em que não vou. Além
em volta do Bugio as gaivotas
descrevem baixos voos
que o céu anuncia tempestade.
Pelas vielas de Alfama
me desdobro em guitarradas
de amor pela cidade.


poema de João Mattos e Silva

segunda-feira, 12 de janeiro de 2015



pintura de Emília Matos e Silva - Rua da Bela Vista (730 mm x 600 mm) p. venda

Constante procura

O que procuro assim tão incessantemente?
Acima de tudo procuro a verdade.
A verdade do amor, do belo, da pureza.
A verdade do sentir.
A pureza do amor inteiro. Amor da dádiva total.
Procuro saber quem sou.
Não o eu que os outros vêm, mas quem sou de verdade.
Quero viver com a verdade do meu eu.
Agir com a verdade do meu eu.
Odeio a mentira.
Odiei-me sempre que menti, mesmo sabendo que o fazia para me proteger.
Com a astrologia comecei a compreender muito sobre mim.
Só podemos melhorar e progredir se nos conhecermos bem.
Descobri muito do que tenho de vencer em mim.
Procurando dentro de mim comecei a encontrar o espírito, a luz que é Deus.
Procuro saber porque estou aqui neste mundo. Que devo fazer? Qual é o meu papel?
Quanto mais julgo que sei, que tenho respostas, mais dúvidas me surgem.
Queria ter respostas, mas possivelmente nunca as encontrarei.
Talvez noutra vida….
Precisava de viver muitos mais anos para saber como encontrar a luz, como participar do todo.


texto Emília Matos e Silva

domingo, 11 de janeiro de 2015





auto-retrato desenho a carvão (colecção particular)


Fui sabendo de mim
por aquilo que perdia

pedaços que saíram de mim
com o mistério de serem poucos
e valerem só quando os perdia

fui ficando
por umbrais
aquém do passo
que nunca ousei

eu vi
a árvore morta
e soube que mentia

Mia Couto, in "Raiz de Orvalho e Outros Poemas", em citador.pt 

quinta-feira, 8 de janeiro de 2015

quarta-feira, 7 de janeiro de 2015





óleo s/tela Emília Matos e Silva - Alentejo (colecção particular)

A tarde é a velhice do dia. Cada dia é uma pequena vida, e cada pôr-do-sol uma pequena morte.


Arthur Schopenhauer

terça-feira, 6 de janeiro de 2015



gravura de Emília Matos e Silva - (755 mm x 565mm) p.venda

O espaço é um corpo imaginário, como o tempo é um movimento fictício
 Paul Valéry

                                                       Árvores Velhas Árvores Olha estas velhas árvores, mais belas Do que as árvores moças...